terça-feira, 30 de setembro de 2014

Crónicas viajeiras... nos Balcãs

Aeroportos:

Certa vez escrevi sobre casas de banho em refúgios de montanha (ver livro ‘Horizonte Branco’ - info em http://ze-tavares.blogspot.com). Agora pretendo fazer uma análise semelhante mas relativa a aeroportos.
Munique: aviões a chegar aos pares (dois aviões lado a lado em pistas paralelas); eleito o melhor da Europa, não sei porquê, mas que tinha cafés, e cacau quente e chá e jornais à borla, tinha!
Já em comparação, os de Lisboa e Salónica (Thessaloniki) são dos poucos que abusam dos ‘caminhos de carneiros’ para conduzir as pessoas (postes ligados com fitas para obrigar a circular em zig-zag e condensar o espaço ocupado), provavelmente achando que é uma solução muito inteligente mas não se apercebendo que as pessoas se sentem como carneiros e, sobretudo as que têm dificuldades de locomoção, acabam por caminhar quilómetros para atingir o que está metros à frente. Por algum motivo os alemães não necessitam usar este sistema. Nem em Munique nem em Frankfurt – talvez o aeroporto mais movimentado da Europa, já que o tráfico de Londres se divide por, pelo menos, três aeroportos. Em Frankfurt vi nove luzes de aviões no ar, em fila, para se fazerem à pista de aterragem. Vi também ratos nas salas de espera… Sendo que os alemães não são nada ingénuos a esse respeito, reparei também que existiam umas caixas metálicas ao nível do solo muito apropriadas para os roedores se esconderem; e, como havia restos de comida pelo chão, calculei que esconderijos e ratos estavam ali de propósito; por outro lado, já as bancas de venda de sandes e comidas deixaram de me inspirar confiança – confiança, aliás, perdida assim que reparei nos preços… 500 paus (2,5eur) por uma bolacha de manteiga, daquelas grandes, com pepitas de chocolate!?! Livra!
 
        
 
Quanto à perda e extravio de malas e bagagem, Madrid tem a pior das reputações que, não sendo disputada com a de um qualquer aeroporto de Cabo Verde, semi-automatizado, não garante a mesma eficácia destes apesar da super automatização… (na foto: retirada de malas para o tapete ‘não-rolante’ na ilha do Fogo). Quanto ao acesso ao aeroporto da Praia, é fácil: como dizem uns amigos que têm casa a uns metros do mar: “olha, lá vem o avião” – a TAP chega de noite e vê-se a luz do avião a avançar na direção da casa deles – “é hora de irmos embarcar” (o check-in feito antes e com tempo de voltar a casa para jantar).

Agora, os Tugas sim que deixam marcas no melhor aeroporto da Europa (Munique, para quem se esqueceu): não levam as canecas da Oktoberfest mas…

 

Incrível Macedónia:

A 2 minutos da partida para Skopje o motorista levanta-se, encara os 10 passageiros do autocarro de 39 lugares, adquire um ar grave, franzindo as sobrancelhas – pensamos que se vai apresentar e explicar o trajeto – e remata ameaçador: “Don’t eat in my bus…”. Ok, estamos prontos para partir!
Em Escópia (Skopje) não há uma única loja de qualquer cadeia internacional. O mesmo é dizer que estas não existem em todo o país. É difícil encontrar certos artigos (gás de camping) mas afinal a solução é fácil: eles vendem o conjunto completo, queimador e botija de gás, bastante barato e ‘made in Macedónia’. Apenas encontrei referências à Europcar e à Coca-cola…



Semanas atrás subira talvez o mais técnico da coleção ‘O cume mais alto de cada país da Europa’ (o Gerlach, na Eslováquia), e também o mais fácil de todos: o Kékestetö, na Hungria, que o Nuno e eu rebatizámos de ‘Kékas’ e fica 1.014 metros de altitude (na foto) mas apenas a 5 minutos a pé desde o local onde deixámos o carro estacionado. Agora, três cumes na última semana. Aliás, em 3 dias! Dois deles às ‘escuras’. 


Não levava mais que um mapa de estradas; acordei uma noite (dentro do carro) a tiritar quando a temperatura se precipitou para os 5 graus; levei tareia de granizo e vento no cimo do segundo pico mais alto da Macedónia; vi-me acossado por cães-pastor em matilha; julguei-me desorientado nas entranhas das montanhas Rudoka; por fim, às apalpadelas, encontrei-me no cume mais alto do Kosovo, na fronteira – controlada por militares - com a Macedónia.

No primeiro dia saí para analisar o terreno, sem ideia de fazer cume (tinha dado o dia por perdido devido ao mau tempo - de noite e madrugada choveram ‘raios e coriscos’. No entanto, as nuvens desafaziam-se ao chegar ao vale de Vardar, embora os cumes permanecessem cobertos. Quando cheguei a meio do caminho o tempo piorou (vento e chuva). Continuei. A 2/3 do caminho, ainda pior: granizo! Mas aí não houve discussão com o cérebro sobre se prosseguir ou não… Por essa altura já as pernas seguiam, sem dúvidas, o seu caminho para o cume, em modo automático.

No segundo dia o tempo melhorou, madruguei e em poucas horas cheguei ao cume mais alto tanto da Macedónia como da Albânia – o Golem Korab (Macedónia) ou Korabit (Albânia), admirando-me pela presteza dos polícias (é necessário anunciar-se mas não existe qualquer burocracia) e pela audácia das pequenas serpentes venenosas que se atrevem e atiçam no meio do caminho. Ao regressar ao ponto de partida (Karaula, a 1470m), os outros 6 pretendentes acabados de iniciar a marcha, o polícia disse-me: “3 hours 10? You are the fastest…”.  

No terceiro dia aventurei-me nas Rudoka mountains. Um homem, em alemão, dissera-me que não fosse… lobos e tal… Não descobri o caminho de terra, no meio da floresta, para as instalações militares. Dormi ali mesmo. O tempo voltou a encobrir. Chuva de manhã. Quando, pelos 2 mil metros, deixei para trás o bosque, ainda não sabia a que cume me dirigir. Então encontrei umas marcas e segui-as. Depois deixei de vê-las. Passei o lago Crno (lago negro) sobre o qual tinha lido referências. Continuei. Encontrei mais marcas… Voltei a perdê-las quando já envolto pelas nuvens. Cheguei a uma crista e segui-a para os dois lados até que num deles estava o marco kosovar, a 2.660m. O altímetro confirmava – o ponto mais alto do Kosovo. Ao descer cruzei-me com um grupo de 7 homens. Ao longe pensei serem militares. Escondi a máquina fotográfica. Afinal eram uns maltrapilhos de mochila e enxada às costas, o primeiro com farda militar (como se um guia). Rodeiam-me e penso “estou tramado”. Uns continuam. O da mochila com uma corda pendurada diz-me que vão para o lago, disfrutar, que o tempo encoberto vai mudar (tsss, que conversa! - penso). Diz que isto é tudo albanês. Macedónio mas com habitantes albaneses, pergunto para retificar. Sim, sim. Se estou sózinho, de onde sou, Cristiano Ronaldo e tal. Ok, bom caminho (despacho-os)! Percebo que vão a salto para a Albânia mas, via Kosovo!? (claro, o outro passo fronteiriço, o do Korab, está melhor vigiado e é mais difícil). Afinal o tempo só piorou. Gente estranha!

Quando chego ao plano, antes da floresta, dois jipes, um deles militar (tinham que ser os daquela gente), estão bem visíveis no terreno inclinado. O meu Fiat Uno, ‘abandonado’ no meio da floresta, está intacto. Sentimento de alívio após 35 minutos de condução nos caminhos enlameados e esburacados da floresta, onde apenas circulavam jipes e camiões de transporte de troncos. Ao chegar ao vale de Vardar, paro para uma sopinha quente e sou surpreendido pelo cântico dos imans de três mesquitas em simultâneo, a chamar para a reza. Belo som para dar por terminada a jornada.


São agora 92 os cumes alcançados — 11 deles entre 4 e 8 mil metros de altitude; 4 dos mais altos dos 7 continentes; 18 dos 20 mais altos (acima dos 2.500m) de cada país europeu; 23 vulcões; 142 dias investidos na montanha (fora aproximações que não a pé); um desnível direto total de 120 mil metros subidos...